SOU PRESIDENTE DO STJ E VOCE ESTÁ DEMITIDO!

Já faz um tempo que esta notícia foi divulgada, mas nunca é tarde para denunciar os abusos e desrespeitos que a elite governamental parasita faz! Leia até o final, depois recolha o queixo do chão e comece a chorar. É nas mãos de pessoas assim que está o tribunal guardião das Leis Federais no país. Uma verdadeira vergonha nacional e um bom exemplo de como essa casta age sem receber punição alguma, assim como nossos políticos... È pra chorar!


A frase acima revela parte da humilhação vivida por um estagiário do Superior Tribunal de Justiça (STJ) após um momento de fúria do presidente da Corte, Ari Pargendler (na foto).

O episódio foi registrado na 5a delegacia da Polícia Civil do Distrito Federal às 21h05 de ontem, quinta-feira (20). O boletim de ocorrência (BO) que tem como motivo “injúria real”, recebeu o número 5019/10. Ele é assinado pelo delegado Laércio Rossetto.

O blog procurou o presidente do STJ, mas foi informado pela assessoria do Tribunal que ele estava no Rio Grande do Sul e que não seria possível entrevistá-lo por telefone.

O autor do BO e alvo da demissão: Marco Paulo dos Santos, 24 anos, até então estagiário do curso de administração na Coordenadoria de Pagamento do STJ.

O motivo da demissão?

Marco estava imediatamente atrás do presidente do Tribunal no momento em que o ministro usava um caixa rápido, localizado no interior da Corte.

A explosão do presidente do STJ ocorreu na tarde da última terça-feira (19) quando fazia uma transação em uma das máquinas do Banco do Brasil.

No mesmo momento, Marco se encaminhou a outro caixa - próximo de Pargendler - para depositar um cheque de uma colega de trabalho.

Ao ver uma mensagem de erro na tela da máquina, o estagiário foi informado por um funcionário da agência, que o único caixa disponível para depósito era exatamente o que o ministro estava usando.

Segundo Marco, ele deslocou-se até a linha marcada no chão, atrás do ministro, local indicado para o próximo cliente.

Incomodado com a proximidade de Marco, Pargendler teria disparado: “Você quer sair daqui porque estou fazendo uma transação pessoal."

Marco: “Mas estou atrás da linha de espera”.

O ministro: “Sai daqui. Vai fazer o que você tem quer fazer em outro lugar”.

Marco tentou explicar ao ministro que o único caixa para depósito disponível era aquele e que por isso aguardaria no local.

Diante da resposta, Pargendler perdeu a calma e disse: “Sou Ari Pargendler, presidente do STJ, e você está demitido, está fora daqui”.

Até o anúncio do ministro, Marco diz que não sabia quem ele era.

Fabiane Cadete, estudante do nono semestre de Direito do Instituto de Educação Superior de Brasília, uma das testemunhas citadas no boletim de ocorrência, confirmou ao blog o que Marco disse ter ouvido do ministro. “Ele [Ari Pargendler] ficou olhando para o lado e para o outro e começou a gritar com o rapaz.

Avançou sobre ele e puxou várias vezes o crachá que ele carregava no pescoço. E disse: "Você já era! Você já era! Você já era!”, conta Fabiane.

“Fiquei horrorizada. Foi uma violência gratuita”, acrescentou.

Segundo Fabiane, no momento em que o ministro partiu para cima de Marco disposto a arrancar seu crachá, ele não reagiu. “O menino ficou parado, não teve reação nenhuma”.

De acordo com colegas de trabalho de Marco, apenas uma hora depois do episódio, a carta de dispensa estava em cima da mesa do chefe do setor onde ele trabalhava.

Demitido, Marco ainda foi informado por funcionários da Seção de Movimentação de Pessoas do Tribunal, responsável pela contratação de estagiários, para ficar tranqüilo porque “nada constaria a respeito do ocorrido nos registros funcionais”.

O delegado Laercio Rossetto disse ao blog que o caso será encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) porque a Polícia Civil não tem “competência legal” para investigar ocorrências que envolvam ministros sujeitos a foro privilegiado."

Pargendler é presidente do STJ desde o último dia três de agosto. Tem 63 anos, é gaúcho de Passo Fundo e integra o tribunal desde 1995. Foi também ministro do Tribunal Superior Eleitoral.

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Viu só?

Agora você quer saber QUEM é o estagiário demitido?

Ok, isso também saiu no blog do Noblat.

Quem é Marco, o estagiário demitido pelo presidente do STJ

Alvo de momento de fúria do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Ari Pargendler, o estudante Marco Paulo dos Santos, 24 anos, nasceu na Grécia, filho de mãe brasileira e pai africano (Cabo Verde).


Aos dois anos de idade, após a separação dos pais, Marco veio para o Brasil com a mãe e o irmão mais velho. Antes de começar a estagiar no Tribunal fazia bicos dando aulas de violão.

Segundo ele, a oportunidade de estagiar no Tribunal surgiu no início deste ano. O estágio foi seu primeiro emprego.

“Não sei bem se foi em fevereiro ou março. Mas passei entre os 10 primeiros colocados e fui convocado para a entrevista final. O meu ex-chefe foi quem me entrevistou”, relembra.

Marco passou a receber uma bolsa mensal de R$ 600 e mais auxílio transporte de R$ 8 por dia.

“Trabalhava das 13h às 19h. Tinha função administrativa. Trabalhava com processos, com arquivos, com informações da área de pagamentos”, explica.

No período da manhã, ele freqüenta a Escola de Choro Raphael Rabello, onde aprende violão desde 2008.

À noite, atravessa de ônibus os 32km que separam a cidade de Valparaíso de Goías, onde mora, da faculdade, em Brasília, onde cursa o quinto semestre de Administração.

Sobre sua demissão do STJ, parece atônito: “Ainda estou meio sem saber o que fazer. Tudo aconteceu muito rápido. Mas já tinha planos de montar uma escola de música na minha região onde moro".


Repasse, talvez chegue até ao Ministro e ele saiba que muita gente sabe da sua prepotência...

Crônica Sobre a Homofobia


No dia 06 de julho de 2010 o jornal Folha de São Paulo divulgou a notícia sobre o envolvimento de skinheads cariocas na tortura e morte do adolescente Alexandre Thomé Ivo Rajão, tudo indica que o grupo tem envolvimento com o caso (assim como a outros casos de agressão a homossexuais da zona sul do Rio), pois “cartilhas” incitando a homofobia foram distribuídas pela periferia do Rio de Janeiro.


Bom, até aí não há nenhuma novidade, visto que este subgrupo genérico e expatriado da Europa sustenta sem nenhum constrangimento sua ideologia tacanha em alto e bom som, no entanto, este ato carrega consigo não apenas uma retórica cega e fanática, mas também uma sentença atestada pela intolerância de nossa sociedade demonstrando o quanto é frágil nossa democracia. Não se trata somente de vítimas ou culpados, se trata das causas que levam a cultivar o ódio, seja ele “simples” e “inocente”, despercebido em forma de piadas feitas entre amigos contra o “outro” ou o “diferente” à até aos modos metodicamente sistemáticos de aniquilação de determinados grupos, como por exemplo, o III Reich Nazista durante a Segunda Guerra Mundial, o Apartheid na África do Sul, o Massacre de Ruanda e na Bósnia, entre outros episódios vergonhosos de nossa história contemporânea.


Na referida matéria os próprios skinheads se defendem alegando que sua intolerância se iguala a de qualquer católico ou evangélico, bem, por esta fala podemos perceber que os séculos das trevas ainda assombram nossas vidas... É a reconfiguração do ódio herdado e refinado aos moldes modernos, se reutilizando de velhos dogmas amalgamados a frustrações, sintomático de um país sem memória histórica e política ainda se arrastando sem identidade rumo à Belle Epóque.

Entretanto, o mais interessante neste artigo publicado pelo jornal foi a análise feita pelo antropólogo Sérgio Carrara sobre a ação cometida pelos skinheads, onde aponta para a falta de estudos como a maior tendência para práticas de atos de intolerância, quer dizer, estamos tratando aqui de burrice pura e simples quando o assunto é racismo, homofobia ou xenofobia. Ou seja, não é necessário teorizar para entender que quem não tem capacidade de entender a questão da outricidade são aqueles que menos lêem, menos estudam e logo, menos pensam, em resumo, são ignorantes do próprio processo social e alienados em potencial, pois apenas: reproduzem-cegamente-e-sem-questionamento-um-discurso-cristalizado-em-verdade-absoluta.


É sempre o velho processo de uniformização caduco-tacanha em ação tentando negar todas e quaisquer possibilidades de autonomia e liberdade a quem tem direito e a aqueles que ousam viver a própria vida. É a nossa herança eurocêntrica (importada como todos nós) que timidamente se disfarça de matéria prima nacional tentando por “ordem na casa” e com um toque de jeitinho brasileiro jogar a sujeira para baixo do tapete e culpando mais uma vez o vizinho.

O Resto É Ruído "Como O Brasil Criou O Gênero Mais Feio do Rock"

Pois bem, como nada se cria e "tudo se copia", estou ripando (e seguindo a velha máxima copyleft do "copie e distribua" que imperava na cena Noise daqueles anos)uma matéria muito interessante sobre Grind e Noise Core no Brasil que acabei de ler, uma verdadeira aula de história underground! A matéria foi originalmente feita por Arthur Dantas, da revista Vice e posteriormente postada no site da Extreme Noise Discos pelo Marcelo (Rot) Batista.



Grindcore, a fronteira final. O dadaísmo virou a arte de ponta cabeça e a negrada dos Estados Unidos colocou a música popular em um nível de sofisticação antes visto apenas na música erudita - ainda que um filósofo alemão chato dissesse que aquela música, o jazz, vinha dos macacos, nas árvores... Mas o Brasil deu sua contribuição ao rock com um estilo que é um verdadeiro soco no ânus de seu irmão mais comportado.
Agressão, sujeira e feiura estética, repulsa e desilusão em seus temas, radicalismos aos montes em sua ideologia. Sim, essa versão desglamurizada e problemática do rock, até o momento, teve sua paternidade atribuída aos pais errados: o rebento feio e desagradável ainda por cima é bastardo. Se isso é mero erro ou má-fé não nos interessa. É a Vice que tem o prazer de rufar tambores em cadência blast beat e gritar, em bom vocal gutural incompreensível: o grindcore é coisa nossa! Longe de nós querermos colocar o grindcore em lugar nobre ao lado do samba. Relaxa: reclamar o teste de DNA do mais radical e iconoclasta dos estilos do rock é o pretexto pra falar do quão específico e curioso é o grind no Brasil. Se essa porra alcançou status de arte, a culpa é nossa.
Curioso é que nossos compatriotas mais afeitos ao gênero nunca quiseram ou souberam reclamar a paternidade do monstrinho. Complexo de vira-lata? Memória curta? O que não faltariam são indagações para entendermos melhor tamanha ignorância. O país que elevou o extremo barulho roqueiro ao status de arte ainda tem problema com o assunto. Converso com Fábio Mozine, baixista do Mukeka Di Rato e João Gordo magro do punk atual, um dos artífices do “hardcore tosco capixaba” - subgênero bagaceiro de rock devedor evidente do grindcore.



Vice: Qual foi a primeira banda grind do Brasil?
Fábio Mozine: Hm... Boa pergunta. Deixe-me refletir: o Rot fazia isso desde 1991? Porém, antes deve ter mais gente, vale banda metal que tinha bateria blast beat (a famosa britadeira)?

Aí pode ser o Sarcófago.
Mas nos anos 80 deve ter uns noise industrial da vida...

E o Brigada do Ódio?
É anos 80. Desgraceira pútrida, Brigada do Ódio é desgraceira total.

Desgraceira. Ok, seu herege. Vou atrás agora do Rodrigo Rosa, baterista do refinado e politizado Ordinaria Hit, que no passado defendera as baquetas de diversos grupos barulhentos e foi ferrenho divulgador do grind em fanzines ainda no interior de São Paulo. O hoje acadêmico especializado em anarquices também foi inquirido por mim sobre o Brigada do Ódio.

Vice: Quando você conheceu o Brigada?
Rodrigo Rosa: Conheci bem depois [de conhecer bandas estrangeiras de grind], nem gostava muito, era todo desconjuntado. Hoje entendo melhor e faz um tempão que gosto bastante. Mas conheci por causa do [LP] split com o Olho Seco.

E você considerava o Brigada uma banda punk ou grind?
Punks tocando grind, que é diferente de somente grind, saca?
Mas o termo grind nem existia quando eles lançaram aquele disco...
Nem sei, é? Então eram punks que tocavam um som desconjuntado!? [risos]


A capa do Brigada do Ódio. Era um split LP com o Olho Seco, cujo lado chamava Botas Fuzis Capacetes

Desgraceira, desconjuntado, punks tocando grind... Malditos nativos que não sabem distinguir uma pedra de ouro de um espelhinho! Terceira tentativa: para Ruy Fernando, ex-vocalista e liderança straight edge por trás do No Violence, finada banda paulistana pauleira que uniu hardcore europeu aos urros e bateria tipicamente grind e recebeu um lugar ao sol na inglória história do gênero no país. Sua visão sobre o Brigada é a seguinte: “Eles são uma coisa doida, deram uma acelerada nas músicas e as desconstruíram totalmente buscando um caos musical. Não sei se é necessariamente uma banda que gerou o grind, pois a estrutura do que veio a se chamar de grind é diferente da estrutura do que eles tocam, que é meio minimalista”.

OK, OK. Eu, o jornalista mequetrefe sedento pelo furo de reportagem proposto pelo meu editor, já entregava os pontos, quando me lembrei da lenda, do mito, daquele-que-todos-falam-com-reverência, Marcelo Batista, 39, ex-vocalista do Rot, um dos mais ferinos e influentes letristas do gênero, fanzineiro e militante do grind desde os tempos mais remotos, o cara que comandava a catarse coletiva da molecada feia e mal-ajambrada - eu, incluso! - nas gigs do Rot por porões fétidos e bares nas periferias durante mais de 15 anos e hoje é o dono da loja de extremismos roqueiros chamada Extreme Noise (homenagem ao Extreme Noise Terror, barulhenta banda inglesa oitentista), localizada em uma galeria próxima à sua irmã mais famosa, Galeria do Rock, no Centro de São Paulo. Que me desculpem os traidores do movimento, os historiadores anarquistas e os advogados que não bebem e nem curtem um churrasco e suas frases obtusas ou elaboradas demais - a César o que é de César. Duas visitas à loja do Marcelo, um pouco mais de uma hora de entrevista com o mesmo e dezenas de horas depois pesquisando em zines, livros, internet, fitas k7, LPs e CDs, posso botar a mão no fogo e defender sim: o grindcore foi parido no ABC paulista, por quatro garotos punks em 1983 e registrado em LP em 1985 sob a marca Brigada do Ódio, ao lado do Olho Seco, uma das mais influentes bandas punks brasileiras. Que queimem no inferno black metal todos os gringos e suas (garanto: muitas mesmo!) teorias eurocêntricas e bem nascidas sobre o grindcore. Muito provavelmente o odor podre daquela novidade estética esdrúxula e atordoante, aliado à nossa contumaz e tropical má-vontade para crer nos santos (péssima analogia) locais cobertos de fuligem da mesma região que viu o nascimento do líder barbudo querido da revista Time, fez com que nós passássemos décadas dando os louros a quatro metaleiros feiosos ingleses sob o logo melhor valorizado no mercado cultural Napalm Death. Se o capital é Deus na pós-modernidade, o grind é o iconoclasta anabatista a vociferar, como fizeram os barulhentos baianos do Bosta Rala em péssimo falsete: “Deus não existe, ele é um idiota!”

“A gente toca o que vem na mente porque, quando a gente tocava originalmente, só se falava de punk. Aí começaram a falar de hardcore, grindcore, mas, se você for se preocupar com isso, você vai ter que fazer uma pós-graduação, porque eu não estou entendendo mais nada.” Esse depoimento de Wilson, baixista do vanguardista Brigada do Ódio, pescado em relato de 2001, é sintomático: se até os pais da criança estão confusos, ao leitor deve soar como filosofia alemã todo esse papo através de um universo underground e hermético tão árido quanto o do grindcore e seus assemelhados. Na conversa com Marcelo Batista, muita coisa se explica, outras se complicam. Mas nem esquenta: se você aguenta seis temporadas de LOST, vai achar tudo aqui muito fácil. É ler e baixar/pesquisar em seu computador.


Vice: Em qual contexto se deu sua entrada na cena de música grind em São Paulo?
Marcelo Batista: Nos anos 80, em Osasco, eu andava com um pessoal que não era muito bem visto porque curtia metal, mas gostava também de Discharge, GBH, Ratos de Porão...

Crossover, a mistura de trash metal e hardcore, né?
É, mas nem existia esse rótulo pra gente; o lance é que eu gostava de barulho. Foi como quando escutei Terveet Kadet em 1985, 86 - era daquilo que eu gostava! E o metal tava se tornando algo grande, mainstream, eu tava perdendo o interesse naquilo. Me interessava pelas bandas pequenas, desconhecidas. Logo quando entrei no Senai em 86, um cara me emprestou uma fita k7 com Chaos UK e Extreme Noise Terror. Quase caí de costas quando escutei aquilo. Daí fui atrás de outros grupos como Heresy, o Napalm Death.

Era muito difícil ter informação sobre essas coisas por aqui.
Muito difícil. Eu era muito interessado no underground, fiz meu primeiro fanzine em 1986, comecei a me corresponder com gente daqui e do Exterior. Eu comprava uma revista holandesa chamada Metal Force e vinha um pôster na revista. No verso do pôster vinha a seção de cartas e você marcava as pessoas que gostavam da mesma coisa que você e se correspondia por carta. Daí fui conhecendo rápido outras bandas, Agathocles, Fear of God, o noise. Carta pra lá, disco e fita daqui, eu recebia uma média de 50 cartas por semana.

Quando você viu pela primeira vez a palavra grindcore?
Quando eu resenhei a fita k7 do Napalm para o meu fanzine da época, eu chamava aquilo de ultra loud and fast hardcore, que era um rótulo que usei na época. Quando saiu o disco aqui, o Scum, peguei primeiro o vinil e a capa 15 dias depois na loja [risos]. No início, esse disco era motivo de zombaria no Brasil. Quando o Napalm veio tocar aqui em 1990, o grind já era bem visto pelos metaleiros e era quase que obrigatório todo metaleiro ter um projetinho barulhento, grind. A galera do interior, que era mais radical, odiava esse povo. Tem registro de show do Extermínio Brutal que eles expulsam um cara com camiseta do Sepultura do show [risos].

Tem essa lógica inversa do grind ao mercado em geral, onde quando você alcança o maior número de pessoas isso sinaliza sucesso. No grind menos é mais em todos os aspectos.
O pessoal do noise morreu aqui no Brasil por causa disso: eles divulgavam noise só pra eles mesmos, um lance de irmandade. Agora apareceu um noise chamado Praia de Vômito [poucos dias depois dessa entrevista, a banda acabou], mas tem pouca relação com o povo antigo que acabou matando o estilo aqui.


Encarte do Brigada do Ódio no LP split. O lado do Olho Seco todo mundo chamava de Bosta Fudi Meu Cacete.

Ah, a garotada, sua testosterona, a falta de mulher, os radicalismos! Não daria pra não falar de alguns causos curiosos desse gênero obscuro no Brasil. A cena grind/noisecore no Brasil era muito grande - tinha gente do Amazonas até o Sul pisando fundo no acelerador e pouco se lixando pra habilidade nos instrumentos. Aliás, muito da cisão e má vontade em relação ao grind vem dessa visão pernóstica e punheteira de que música é algo para quem sabe tocar. Vamos lá, galera: que papinho mais início de século 20! É por essas e outras que música noise acabou ficando na mão de uma garotada bem nascida e com ambições artísticas - nada contra, mas o buraco aqui é bem embaixo. Desde o Sonic Youth, pelo menos, ficou cool fazer barulho. Então vamos mostrar o que faz do Brasil um lugar tão idiossincrático e destemido de gente que não desiste nunca.

Assim como o baterista do Napalm Death diz ter criado o termo grind em razão das músicas do Swans (uma banda da cena art noise de Nova York de onde saiu o Sonic Youth), nós podemos dar um toque mais vanguardista e colocar como pedra fundamental da antimúsica no país os mais de 20 discos lançados pelo ex-marinheiro e ex-cafetão Damião Experiença. A lembrança de seu nome, inclusive, veio do próprio Marcelo do Rot. Com seu estilo mendigão, dreads sujos e grisalhos, e suas frases impronunciáveis no dialeto do planeta Lamma, a lenda de Ipanema tá na estrada desde 1974 e tem sua carreira dividida em cinco fases por uma legião damiônica de fãs. A primeira fase, minimalista, contava com gravações do dialeto Lamma e com violões de uma a cinco cordas. A segunda fase é a mais “zen”, com odes acústicas ao Hitler, aos cornos, ao Fidel e ao planeta Lamma - tudo isso em três idiomas diferentes. A terceira fase sobrepõe quatro ou cinco faixas acústicas previamente gravadas, e o resultado é caos polifônico. E por aí vai.

Nos anos 90, os anarcopunks soteropolitanos do Bosta Rala marcaram época com seu som misto de grind, Raul Seixas e Damião Experiença e punk 80 brasileiro com letras que tratavam sobretudo da brutalidade da ação policial - seu maior hit foi a música PM Idiota. O curioso é que a garota nos vocais fazia as vozes graves e o homem os falsetes. Aliás, um dos integrantes do grupo foi morto em condições não-explicadas até hoje por um policial. Por que será, hein?

Mais recentemente, os paulistanos do Rattü Mortö, outro grupo grind/noisecore divulgadores e entusiastas da arte damiônica, ganharam espaço ao criar um verdadeiro teatro do absurdo em apresentações ao vivo, e entraram pelas portas dos fundos no mundo da alta cultura. Um artista sonoro experimental realizou uma performance na Galeria Vermelho onde gritava “Na Galeria Vermelho não toca Rattü Mortö”. O grupo grindnoise paulistano - ou, como eles preferem, “pioneiros na antimúsica conhecida como esgotocore, uma sinfonia tocada com ‘instrumentos’ feitos de refugo achado nos entulhos e depósitos de lixo” - faz duas ou três apresentações por ano nos mesmos buracos de sempre e não se rendeu a um possível oba oba da modernagem descolada local e segue divulgando seu CD-R em papel para embrulhar pão.

Nesse universo de poucos tons e muita opinião, venenos sobre tudo, se proclamar anti alguma coisa era missão de fé. Parece até piada, mas os gaúchos de Pelotas do Carnegus, “banda antimulher e pró-estupro” diziam, em release de 1992, que “nossa visão de humanidade nos fez notar a idiotice que eram coisas como namoro, amor, sexo, enfim, todas essas nojeiras coletivas que fazem do mundo uma coisa mais estúpida ainda. (…) Não aceitamos contato com a espécime por nós tida como inferior (mulher)”. Pode ser brincadeira, mas não consigo medir o que seria mais bizarro, a realidade ou a fantasia.

Mas nem tudo são vozes guturais e ideais esdrúxulos por aqui. O Purulence, quarteto grind do interior de São Paulo (Rio Claro) se destacou por sua formação feminina; não conheço nenhum outro grupo feminino de grind no planeta. Gritando pelos diretos femininos e contra o sistema, as Irmãs Galvão da música feia lançaram algumas demos e um compacto em vinil que vale cem reais em site de leilão na internet. Se tua filha não tiver um talento musical reconhecido por conservatórios musicais, incentive-a: estão aí exemplos de Purulence até Mallu Magalhães que poderão te render algo no futuro.

Ruy Fernando, o straight edge do começo do texto, lembra de uma história curiosa em um show de sua banda, No Violence, em 1990. “Tocamos num skate park na zona norte de São Paulo, e foi a primeira vez que vimos uma banda que se dizia grindcore. O vocalista apresentava as músicas em vocal gutural, o que fazia com que ninguém entendesse nada do que ele dizia, parecia que era uma música só com diversas paradinhas dos instrumentos e um solo de vocal gutural, só depois de uns cinco sons é que fomos entender que a paradinha era o fim da música e o gutural solo era o nome da próxima.” Um amigo meu do interior de Minas relembra outra parecida. Havia um duo noisecore chamado Masher que, definitivamente, não sabia tocar NADA. Assim, barulhos de 10 segundos eram entrecortados por explicações desses mesmos intermináveis, aquela ladainha de fanzine punk adolescente contra o sistema e a sociedade. Se esses não viraram pastores estão perdendo dinheiro. Voltemos à vaca fria...



Vice: Explica essa distinção do grind que vem do punk e o que vem do metal?
Marcelo Batista: Historicamente, o grind é basicamente uma galera que gostava de metal, mas estava descontente com aquilo e gostava da pegada do hardcore, se interessava por política. Era uma mistura de Repulsion, Lärm, Asocial, Napalm Death, Agathocles, Fear of God. No caso do Napalm, que foi a banda que mais se destacou, acabou ficando cada vez mais metal. E isso fez com que uma leva de grupos sem relação com o hardcore aparecesse, como tudo depois do Carcass, o Morbid Angel. O Sarcófago era uma banda de metal muito à frente de seu tempo.

E aí teve uma cisão mesmo: o grind mais político e o grind mais metaleiro?
É. A cena grind mais política durou até 1998 - não que seja inexistente hoje, mas é esquisita. Tem ainda o Agathocles... Mas são bandas que correm por fora, assim como foi com o Rot. O pessoal hoje gosta de Nasum (banda sueca que destrinchou o grind feito inicialmente pelo Napalm Death e ganhou uma legião de fãs fanáticos) pra frente, esse grind mais moderno. E o pessoal que veio depois nem sabe da existência de um Agathocles, por exemplo. É igual ao que rolou com o black metal - tem gente que ouve o estilo hoje e nem gosta de Venom.

E no caso específico do Brasil?
É um grind mais técnico, metalizado, mas a cabeça deles não é como a da minha geração. O Rot resistiu 15 anos pra aparecer na [revista clássica dos cabeludos] Rock Brigade, nunca quisemos ir na MTV. Hoje se aparecer uma brecha a molecada tá lá, perdeu aquela coisa do radicalismo.

É engraçado que eu não consigo desvencilhar o grind e todos esses gêneros mais violentos de algum tipo de radicalismo, porque esteticamente a coisa é uma afronta, ninguém tá ali buscando beleza no sentido clássico do termo...
Na história da música sempre ouve isso: o hardcore veio e comeu o punk rock. E o hardcore foi levando até o extremo e chegou-se no grindcore e noise e foi a morte do hardcore também, como diz o Eric do Fear of God. Essas bandas deram origem a coisas que não tinham mais a ver com o hardcore.

O que te levou a tocar grind e não punk, por exemplo?
Eu nunca quis ter uma banda, nunca foi minha ideia, mas em 89/90 o pessoal lá de Osasco precisava de vocalista e me chamaram. E se eu fosse tocar numa banda naquela época ia querer tocar algo como Extreme Noise Terror, Olho Seco, Brigada do Ódio. E eles eram mais do metal. Daí a gente dosou. E foi o que aconteceu com o Napalm Death também.

E com quem o Rot tocava no início?
Normalmente era o pessoal do metal. Mas tocamos com o Ameaça Nuclear, o Final Terror, que eram bandas que já estavam na mesma sintonia do que nós. A gente tocava muito com uma banda de metal chamada Pentacrost.

Quando comecei a ouvir falar do Rot, em 1994, vocês já tocavam com o pessoal do anarcopunk, do hardcore mesmo.
Mas voltando um pouquinho, nessa coisa de tocar junto com o pessoal do metal, surgiram umas bandas como Necrobutcher (depois “corrigiram-se” com o SRMP), Mayhem Decay Cudgel... Bandas que citavam Bathory, Sarcófago, Napalm: bandas que estavam na esfera do metal. O Rot corria por fora. Lembro de cara falar “o compacto de vocês é legal, mas vocês nem usam visual”. Porque a gente usava as roupas que tinha, de trabalhar. A nossa visão do grind já era um lance muito hardcore. E eu vi a J.L. (Juventude Libertária, agrupamento radical da época) nascer, o anarcopunk, mas a gente fazia as coisas do jeito que queria, não queria ter o rabo preso com ninguém. A gente continuou tocando com todo mundo. Até os últimos dias com o Rot você via todo o tipo de gente em nossos shows. O pessoal do metal ficou bem distante, mas a gente continuou tocando com eles também.

E aquela história do manifesto que você escreveu?
Foi em 1991. Eu via bandas como o Necrobutcher, Extermínio Brutal, mas não era o que eu via de grindcore lá fora. Escrevi o manifesto, o Rot ficou malvisto por muitos etc. Mas aquilo plantou uma sementinha de que dava pra fazer algo grind sem ter que falar de satanismo etc. que eu achava e acho bobo. E começaram a surgir bandas como Hinfamy, No Sense, Death Slam, Bones Erosion, entre outras que já tinham esse lance mais hardcore como nós.

E a coisa toda cresceu muito no interior...
Cara, tinha banda barulhenta em todo lugar que você imaginar. Minas Gerais, Bahia... Todo lugar tinha banda noise, grind; o auge foi entre 1993 e 96. Todo mundo lançava muito compacto, fita K7, fanzines.

Além do estilo musical, há outros traços que distinguem o grind/noise?
Uma característica muito forte era esse lance de trocar fitas, de irmandade. Isso se perdeu com o tempo, a internet foi importante nesse processo. O Rot pegou o último foco da cena de tape traders (trocadores de fitas k7) - o Napalm Death se serviu muito dessa cena. Eu era louco pra pegar qualquer gravação do Rot e sair trocando com os outros pelo Correio.

Você me falou que a banda santista Psychic Possessor foi uma das suas maiores influências, mas que eles não eram bem vistos na época. Por quê?
Porque eles faziam questão de frisar que não eram uma banda de metal. Pra mim foi uma referência em termos de atitude, de ver que dava pra ser inteligente naquele meio. O LP Toxin Diffusion é um clássico pra mim.


Colagem inédita feita por Marcelo Batista há um tempão atrás. Acabou saindo um encarte parecido do Rot depois.

“Grindcore rejeita estruturas e melodias em favor de explosões cruas e violentas de guitarra, baixo e bateria.” No mesmo site de metal de onde saiu a citação anterior, diz-se também que o gênero surgiu com o álbum Scum do Napalm Death de 1987 e que “(...) muitos dos seus expoentes principais se mudaram para o death metal e o industrial. No entanto, a abordagem intransigente do hardcore de como fazer música desconfortável inspirou dezenas de artistas noise experimentais”. O livro Choosing Death: The Improbable History of Death Metal & Grindcore, de Albert Mudrian, clássico sobre o assunto, segue a mesma toada e coloca o Napalm Death como ponto de partida da história.

“O Fear of God era uma banda noise (e não ‘grind’ ou outra coisa do gênero). Nós não queríamos fazer música - nós queríamos destruí-la.” A frase escrita por integrantes do Fear of God para o encarte do vinil duplo Zeitgeist, com toda a discografia do grupo, lançado pela (que coincidência!) gravadora do Marcelo Batista, Absurd Records, polemiza com o termo criado pelo povo do Napalm e busca colocar o FOG em um posição - sempre a mesma ladainha - mais radical. Só que, noise ou grind, chegou a hora do acerto de contas definitivo e a prova por A + B que o barulho é nosso.


Vice: Por que você acha que o grind se desenvolveu tão rápido em tudo quanto é buraco no mundo? Era uma necessidade de comunicação ou era mais falta de público local mesmo?
Marcelo Batista: Um pouco de ambas as coisas. Essa coisa barulhenta era muito mal vista no início, tem história do Fear of God ser recebido com garrafadas em squats lá fora, tinha essa necessidade de conhecer gente de outros lugares. Imagina o Patareni na Croácia? Quantas vezes eles não devem ter sido expulsos do palco? O Bosta Rala? Eles tocavam em festinha de faculdade em Salvador, imagina como não era a recepção? [risos].

Quando você começou o Rot conhecia Brigada do Ódio ou só bandas gringas? Havia referências nacionais?
Eu conheci o Brigada do Ódio um ano depois do disco de 1985 ter saído. No geral, a galera ficou conhecendo o Brigada através do Olho Seco - ninguém levava muito a sério o Brigada. Ninguém tinha noção que eles foram pioneiros. Mas tinha o Atack Epiléptico em BH, Ulster e o Nada do ABC paulista.

E eles foram pioneiros mesmo?
Sim, com certeza. Eles foram o primeiro grupo a colocar 26 sons em um lado de disco. Nessa época o Napalm Death tava tocando punk rock [risos]. Colocar o Brigada dentro do grind aqui no Brasil é um lance que começou no meio dos anos 90, quando começaram a levantar as origens da coisa toda. Pode até ter existido alguém antes, mas ficou só em fita k7 - em LP foi o Brigada o primeiro. Tiveram duas bandas na mesma época do Brigada que só ficaram em ensaios fazendo aquele tipo de som, era o Hellsaw, pré-Agathocles na Bélgica, e o Occult nos Estados Unidos, que deixou gravado dois sons apenas.


Então é isso, gringos: fiquem com a paternidade da invenção do avião e os ingleses podem até ter inventado o futebol, mas o lance é o seguinte: ninguém sabe avacalhar algo melhor do que nós, brasileiros. Grind e noisecore são coisas nossas!